domingo, 12 de setembro de 2010

Editoria Caleidoscópio Baiano

Mídia e Violência

             Fonte:  Google

Claudia Correia

Neste importante espaço de reflexão sobre a função social da mídia estamos tendo uma experiência rica de debater de forma democrática nossas idéias, compartilhar sonhos e provocar saudáveis discussões sobre como podemos construir alternativas para democratizar a comunicação no Brasil.

Tenho tido pouco tempo de participar de debates ao vivo e a cores pelo volume de trabalho que demanda meu tempo e energia neste segundo semestre.

O último que participei, o Seminário “Mídia e Direitos Humanos”, realizado dia 26 de agosto, na Faculdade de Comunicação da UFBa, rendeu uma pequena cobertura que compartilhei com os amigos blogueiros e simpatizantes do tema.

Dentre os expositores da Mesa sobre experiências de monitoramento da mídia estava o Instituto Mídia Étnica. A ong congrega profissionais e estudantes de Comunicação empenhados em construir um trabalho sério que aposta na cidadania, no direito humano à comunicação e na formação de jovens negros comunicadores. O resultado são iniciativas muito ousadas e criativas. O portal http://www.correionago.com.br/ , do qual sou colaboradora, reflete esta diversidade de olhares e traz muita informação de qualidade.

Na minha cobertura deste Seminário não pude detalhar muito alguns trabalhos apresentados. Optei por um panorama mais geral dos debates de todas as mesas. Pedro Caribé, do Observatório do Direito à Comunicação, apresenta alguns indicadores da violação de direitos promovida por dois programas televisivos locais e achei interessante reproduzir aqui o seu texto. Ele integra o time de colaboradores do Correio Nagô.

O que me chamou atenção é que apesar da denúncia das entidades sociais envolvidas com a temática, ainda é incipiente a atuação das instâncias públicas de fiscalização dos abusos cometidos. Ainda há espaço para os que critiquem este controle alegando que a imprensa é livre e não deve haver qualquer tipo de censura. Este argumento não se sustenta. A I Conferência Nacional de Comunicação aprovou o controle social da Política Pública de Comunicação através dos conselhos e o Estado pode e deve coibir a violação de direitos humanos através da mídia sim. Afinal trata-se de uma concessão do poder público o funcionamento destas emissoras.

Aliás, sete de setembro se comemora a “ Independência “ do país e um Brasil livre, soberano e altivo precisa de uma imprensa com responsabilidade social. Ela também forma, educa, constrói representações, sentidos, visões de mundo.

Vejam o artigo do meu conterrâneo e tirem suas conclusões.


*Claudia Correia, assistente social, jornalista, profª da ESSCSal, Mestre em Planejamento Urbano e Regional. Contato: ccorreia6@yahoo.com.br.


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PROGRAMAS DE TV VIOLAM DIREITOS HUMANOS NA BAHIA


Pedro Caribé

O resultado dos primeiros seis meses no monitoramento a dois programas televisivos policialescos na Bahia foi apresentado pelo Centro de Comunicação, Democracia e Cidadania (CCDC) e confirma a constância na violação aos direitos humanos entre o meio-dia e 14h em emissoras filiadas ao SBT e a Record: a TV Aratu e Itapoan, respectivamente.

Os programas analisados - Se Liga Bocão (Record) e Na Mira (SBT) - são alvo de recorrentes reclamações da sociedade civil na Bahia, que conta com a parceria do Ministério Público Estadual (MPE) para tentar, ao mínimo, amenizar a situação. Os dois ficaram entre os cinco programas mais denunciados à campanha Ética na TV em 2009.

Publicidade, merchandising e ações assistencialistas são mescladas com imagens de cadáveres, sentenciamento ilegal e exposição de crianças e adolescentes em situações constrangedoras nos bairros populares e espaços administrados pelo poder público, em especial no interior das delegacias e hospitais. Os jovens e adultos negros do sexo masculino são os maiores alvos dos programas, as mesmas vítimas majoritárias dos homicídios que assolam Salvador e sua região metropolitana.

O estudo foi apresentado em 26 de agosto durante Seminário de Mídia e Direitos Humanos organizado pelo CCDC, um órgão complementar da Faculdade de Comunicação (Facom) da Universidade Federal da Bahia (UFBA), coordenado pelo diretor da unidade, Giovandro Ferreira, e atualmente sob as parcerias da Ong Cipó Comunicação Interativa e Intervozes-Coletivo Brasil de Comunicação Social.

O projeto de monitoramento do CCDC é financiado pela Fundação Ford, coordenado pela Cipó e auxiliado pelo Intervozes e professores da Facom/UFBA. Durante o desenvolvimento também foram colhidas contribuições da professora Tânia Cordeiro, adjunta da Universidade Estadual da Bahia (UNEB) e outras organizações como o Instituto de Mídia Étnica e Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia (AATR).

Os dados apresentados são relativos aos meses de janeiro e junho de 2010. Em outubro será lançada uma publicação. Desde janeiro os dois programas são clipados diariamente, mas apenas uma semana de cada mês é escolhida para aprofundar a pesquisa. As análises também relevam as estratégias discursivas utilizadas pelas emissoras para fixar a atenção do público.


Propaganda e sangue

O acompanhamento dos programas incluiu o intervalo comercial. Durante quase uma hora de exibição diária o Na Mira costuma destinar 32% e o Se Liga Bocão 44% do tempo para publicidade. Já o merchandising fica atrás com 17% e 12% respectivamente. Segundo Daniella Rocha, coordenadora da Cipó, esses dados demonstram que ambos dão retorno financeiro e audiência. Alguns casos são emblemáticos como o merchandising do Danoninho no Se Liga Bocão. A marca de iogurte banca promoção para as crianças produzirem vídeos caseiros e veicularem no ar.


Os anunciantes mais comuns no período analisado no Se iga Bocão foram: Insinuante, Ricardo Elétrico, Governo da Bahia, Prefeitura Municipal de Salvador, Atacadão Atakarejo, Bom Preço, Calcittran B12, Novo Tempo, Extra e Traxx Motos. No Na Mira, a arrecadação com publicidade aparenta ser menor, a levar em conta a audiência da TV Itapoan e o tempo dos anúncios: G Barbosa, Novo Tempo, Calcittran B12, C&A, Varicell, Insinuante, Banco BMG e Governo Federal, estão entre os mais constantes. Nos dois nota-se presença significativa dos gastos públicos com publicidade .


Os quadros assistencialistas e que se reportam a assassinatos e ações policiais são os mais recorrentes após a parte destinada ao tempo comercial. No caso do acompanhamento a trabalhos da polícia é perceptível uma promiscuidade na relação entre setores da corporação e os programas. O setenciamento ilegal ou incitamento à violência são violações presentes em cerca de 5% das reportagens. Além disso, imagens internas de delegacia aparecem em 33% do quadros do Na Mira e 15% no Bocão.

Ministério Público

Presente no Seminário, a promotora da 1ª Vara Cível do Juri, Isabel Adelaide, lembra que na maioria dos casos que se transformam em matérias dos programas não são coletadas provas suficientes para condenação dos acusados, tornando os casos como infundados e falaciosos. A promotora também ressalta que o delegado chefe da Polícia Civil na Bahia já determinou que não se permitisse filmagens internas em delegacias. Isabel Adelaide também ficou entre 2006 e 2010 na coordenação do Grupo de Atuação Especial para o Controle Externo da Atividade Policial (GACEP), quando organizações sociais enviaram uma Moção de Apoio, Aplauso e Vigília ao MPE.

Em 2009, os programas firmaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) devido a constante exposição de imagens de crianças e adolescentes. Daniella Rocha destaca que formalmente estão cumprindo a situação, porém: "Em determinados casos, filmar ou não rosto da criança é o que menos importa, uma vez que o resto do seu corpo e de sua vida foram expostos. Teve um caso emblemático de adolescente de 13 anos vítima de abuso sexual que engravidou e fez aborto mal sucedido. Durante dez minutos o programa explorou o caso, contando detalhes da relação, do aborto e etc”

Os bairros populares são os espaços onde se passam a maioria das reportagens de ambos os programas, com homens negros ou pardos. Nas abordagens policialescas são comuns frases discriminatórias como essa: "Quando a gente pára pra abordar alguém é porque já conhece a fisionomia... a polícia não trabalha por adivinhação, já vai no elemento certo", proferida pela delegada Patrícia Nuno, titular da 1ª Delegacia em Salvador.

 


* Os gráficos são do Centro de Comunicação, Democracia e Cidadania da UFBA.

Um comentário:

  1. A luta pelo direito a assistir uma programação de qualidade ainda promete muitos "rounds" pela frente, mas uma parcela expressiva da sociedade tem demonstrado em vários âmbitos que a fórmula de espetacularização da violência não é o que desejamos encontrar nos nossos programas educativos.
    Somando esforços com algumas organizações já obtivemos resultados e ainda obteremos mais.

    Obrigado por compartilhar conosco estas informações!

    Um abraço!

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